E se delimita a parte correspondente a cada uma das mesmas em base à lei da oferta e demanda.

Quanto à economia islâmica – segundo o mártir As-Sadr – na mesma não é correto que se conte como fonte de produção mais do que à natureza, depois de descartar como tal ao capital e ao trabalho, já que se considera que o capital – em realidade – é uma riqueza produtiva e não uma fonte básica para a ação de produção, já que, economicamente, consiste em qualquer riqueza originada através de uma ação humana que participa novamente na produção de uma nova riqueza, como o é a máquina de tecer, a qual não consiste numa riqueza natural pura, senão que é uma matéria naturalmente, à qual o trabalho humano lhe deu forma através de uma ação de produção prévia.

Quanto ao trabalho, este é o elemento que forma o espírito das fontes de produção, já que não é uma riqueza material que intervenha no espectro da propriedade privada ou pública.

Em base a isto, a natureza é a única fonte de produção real[1]. O mártir As-Sadr classificou as fontes naturais assim:

1- A terra: é a mais importante das riquezas naturais, sem a qual o ser humano praticamente não poderia levar a cabo nenhum tipo de produção.

2- As matérias primas: as quais estão contidas na crosta terrestre, como o carvão, o fósforo, o petróleo, o ouro, o ferro e os diferentes tipos de minerais.

3- As águas naturais: as quais se consideram uma das condições da vida material do ser humano, e jogam um sério papel na produção agrícola.

4- O resto das riquezas naturais formadas pelo conteúdo dos mares, os rios, os vegetais e animais que vivem sobre a terra, e as forças naturais disseminadas nos cantos do cosmos.

O mártir As-Sadr desestimou ao capital e ao trabalho (como pertencentes às fontes de produção), partindo de sua classificação do tema na: distribuição da riqueza em etapas prévias à produção, e sua distribuição numa etapa posterior. O capital e o trabalho não figuram dentro da primeira etapa desde que na mesma não há mais fontes de produção do que a natureza, o qual faz que esta última seja a fonte básica e única, cujas riquezas só se convertem em “propriedade” em base ao trabalho. É por isso que o trabalhador permanece como o único que, em base a seu trabalho, volta-se proprietário dessas riquezas, já que é o trabalhador o que gastou seu esforço, aproveitou essa riqueza e se fez da mesma, e esta não sai de sua propriedade senão com seu beneplácito.

[1] Ibídem, p. 413.

A relação entre a produção e a distribuição

As teorias marxista e islâmica discrepam no referente a reconhecer a existência ou não do vínculo entre a produção e a distribuição. Enquanto o marxismo faz questão da existência deste vínculo e sua consolidação de acordo à lei do progresso, a qual requer um tipo particular de distribuição que harmonize com a forma de produção, a teoria islâmica recusa esta dependência – ou seja a dependência entre as relações de distribuição e a forma de produção – e considera que “as leis de distribuição que trouxe o Islã são estáveis e convenientes para toda época e lugar, e nisso não há diferença entre a época da eletricidade e o átomo e a época do vapor, nem entre esta última e a época do moinho de vento e a de manufatura”.[1] Mas a teoria islâmica ao negar e recusar essa dependência não corta pela raiz o vínculo entre a distribuição e a forma de produção, senão que o Islã acredita no vínculo que a mesma escola impõe, e delimita em base a ele a produção em benefício da distribuição, em lugar de adaptar a distribuição conforme as necessidades da produção.

Tudo o que recusa o Islã é essa relação de dependência conforme a uma lei natural, como o mesmo marxismo reconhece. Por isso, dentro do Islã, a ação de produção se converte num receptáculo para aplicar as leis de distribuição, e é em correspondência a isso que se origina o vínculo doutrinal entre a produção e a distribuição, a qual em realidade retorna à idéia de aplicação orientada a qual outorga ao Wali Al-Amr o direito a delimitar a produção em benefício da distribuição.

[1] Ibídem, p. 640.

Os elementos de distribuição

O mártir As-Sadr opina que: “O aparelho de distribuição no Islã se compõe de dois elementos principais que são: o trabalho e a necessidade, e cada um destes dois elementos cumpre uma função ativa no campo geral da riqueza social”.[1] Quanto ao trabalho, o Islã o considera um meio para que o trabalhador se faça proprietário do resultado de seu trabalho, como assim também considera a essa propriedade privada fundamentada no trabalho “como a expressão de uma inclinação natural do ser humano de possuir o resultado de seu trabalho. Tal inclinação retorna ao sentimento que cada indivíduo tem de ter domínio de seu trabalho, já que este sentimento inspira naturalmente a tendência a querer dominar sobre os resultados e ganhos do trabalho. Dessa forma, a posse baseada no trabalho próprio é um direito do ser humano, que parte de seus sentimentos primários”.[2] “Então o trabalho é o fundamento para a posse da qual se faz o trabalhador, desde o ponto de vista do Islã, com base a isto, vemos que é o elemento principal no aparelho de distribuição islâmico, já que cada trabalhador tem prioridade sobre as riquezas naturais que consegue mediante o trabalho, e se volta seu possuidor de acordo à lei que diz que o trabalho é causa de posse”.[3]

(Isto, no que se refere ao trabalhador independente). Quanto ao trabalhador (que se aluga a si mesmo), aquele que trabalha na fábrica para trabalhar sobre uma matéria em particular a fim de transformá-la dentro do marco da produção secundária, este é um empregado e não se converte em proprietário (daquilo sobre o qual trabalha).

O mártir As-Sadr diferenciou também entre duas etapas, uma a etapa na que a sociedade islâmica marcha de acordo às leis de distribuição islâmica, e outra etapa na que a sociedade marcha de acordo a condições corruptas, e se lhe deu ao estado o grande papel de devolver os assuntos a seu correto leito.[4]

O outro elemento fundamental é a necessidade, já que este elemento participa na ação de distribuição simultaneamente do trabalho, desde que a distribuição tem lugar para os que são capazes de trabalhar de acordo ao primeiro elemento, enquanto as classes impotentes de trabalhar se afiançam no segundo elemento da distribuição – ou seja a necessidade – para tentar sua parte da distribuição, e a garantia de uma vida completa em base a sua necessidade, de acordo aos princípios de subsídio geral e segurança social na sociedade. As classes capazes de trabalhar que não podem tentar-se todas as necessidades, apóiam-se nos dois elementos ao mesmo tempo: o trabalho e a necessidade.

Existe um elemento secundário de distribuição que é a propriedade mesma. Isso é assim desde que o Islã reconhece o ganho comercial, através das atividades comerciais que permitiu no marco de certas condições particulares que não se opõem aos princípios islâmicos de justiça social[5].

[1] Ibídem, p. 331.
[2] Ibídem, p. 334.
[3] Ibídem, p. 334.
[4] Ibídem, p. 334.
[5] Ibídem, p. 345.

A responsabilidade do estado na economia islâmica

O conceito de estado tem estado sujeito a transformações ao longo das épocas, passando desde o conceito de um estado “protetor” e “vigilante” ao de um estado “regulador”. A transformação desse conceito não se dava senão depois de uma experiência dura e amarga. O estado era responsável da proteção de seus súbditos sem imiscuir-se em suas atividades individuais, econômicas, comerciais, agrícolas e industriais. Nesse então não devia imiscuir-se senão em interesse dos indivíduos e de sua segurança interna e externa, sem impor restrições a sua liberdade no concernente ao comércio, a indústria e a agricultura. Isso se baseava no que denominaram “a lei natural” a qual diz que: “os interesses da comunidade como um todo se concretiza indefectível através do trabalho de cada indivíduo pertencente à mesma, o qual realiza para concretizar seus interesses particulares”, e isso é o lema que expressa o conteúdo do liberalismo o qual não permite ao estado imiscuir-se a não ser que seja em conveniência desta lei, ou seja somente dentro de seus considerandos e sem tratar de entorpecer sua atividade. É das entranhas desta lei que surgiu o capitalismo, cuja evolução requer a imposição de uma liberdade de comércio e de trabalho, a limitação da intromissão do estado na atividade econômica, e a restrição de sua função de organizar e proteger a concorrência nos mercados.

Este é o princípio fundamental nos sistemas capitalistas. Quanto ao regime socialista, o princípio fundamental deste é a direção que o estado efetua da atividade econômica, a magnificação de sua função centralizada na delineação econômica, o domínio sobre a maior parte das capacidades econômicas e reservar-se à faculdade de estabelecer as resoluções econômicas. Tudo isto se resume no lema “a centralidade rigorosa e estável”.

Este é o princípio segundo cada uma destas duas escolas: no capitalismo é a não-intervenção do estado e só se aceita tal intromissão em casos de “exceção”. O princípio de base no socialismo é a intervenção do estado, ou bem “o capitalismo e supervisão do estado”, e a não-intervenção é aqui a que se aceita só em casos “de exceção”.

Mas a realidade é que o assunto não permanece dessa maneira em nenhuma das duas escolas, já que nos sistemas capitalistas o papel econômico do estado tende para o aumento, e dessa maneira a força que – até ontem – proclamava a liberdade de mercado é ela mesma a maior impulsora para ativar o papel do estado na atividade econômica e o aumento dos meios para sua intromissão. O transbordamento das imprevistas crises pelas quais passou o capitalismo e que ainda continuam contribuiu a isto.

O acontecimento das duas guerras mundiais teve seu grande efeito em aumento do papel econômico do estado nesses regimes e para criar uma fonte econômica para enfrentar a crise da guerra. Depois das duas guerras o estado capitalista conservou sua supervisão econômica, especialmente na realidade capitalista na que começaram a manifestarem crises econômicas que ameaçam a vida desse mundo puramente cobiçoso e materialista.

Assim mesmo no mundo socialista, as coisas não foram como o tentavam no referente a uma centralidade inabalável e a uma intervenção direta, e a dispor as resoluções estatais, já que o estado que desapropriou os grandes e pequenos bens, que anulou a propriedade privada dos meios de produção e dos meios de agricultura, que nacionalizou todas as empresas industriais e comerciais, etc., e que se reservou para si o dispor resoluções econômicas, depois de passar quatro anos anunciou que se retratava de sua posição e se despojou de sua função centralizadora, permitindo a liberdade econômica aos capitalistas e propriedades privadas, inclusive permitiu às companhias ocidentais praticar o monopólio em países socialistas.

Isso sucedeu na época do mesmo Lenín quando concedeu a uma companhia americana o monopólio na exploração de algumas riquezas no montes Urales; depois concedeu ao redor de vinte tipos de monopólios mais as companhias inglesas, alemãs, francesas e americanas. Ele escreveu dizendo: “Nós somos ricos e pobres ao mesmo tempo. Acostumamo-nos a dizer que o socialismo é algo bom e que o capitalismo é uma coisa má, mas o capitalismo não é mau senão em relação ao socialismo, mas em relação à Idade Média, que é na qual Rússia permanece atrasada, o capitalismo não é mau”[1]. Foi Lenín mesmo o que descreveu os novos lineamentos que continham uma volta ao regime econômico combinado e de fases[2]. É dessa maneira que o último ao que o socialismo chegou é à revolução da “Perestroika” e o que se deu em chamar as “reformas” e a “reestruturação”.

Este artigo não pretende realizar uma comparação entre esses dois tipos de sistemas, senão na medida que explicaremos com respeito ao princípio de intervenção do estado na teoria islâmica e os limites de dita intervenção, seus meios e seus objetivos. Qual é o princípio no relacionado à intervenção do estado na escola econômica islâmica? quais são seus limites, objetivos e as fontes e meios de tal intervenção? Tudo isso à luz das idéias e teorias do imam mártir As-Sadr, que Deus se compadeça dele.

Na escola econômica islâmica “a intervenção do estado na vida econômica se considera como um dos princípios fundamentais na economia islâmica, e é a que lhe concede o poder e a força para abarcar e englobar”,[3] já que esta intervenção lhe possibilita às normas econômicas do Islã e seus preceitos o poder para solucionar os problemas econômicos e materializar a justiça e o equilíbrio social. Estas normas, apartadas deste princípio, manifestam-se desprovidas dos meios que a transladam do âmbito da teoria à esplanada da realidade, a execução e a aplicação. Com este princípio se manifesta a idoneidade das normas da economia islâmica para todo tempo e lugar, e para toda época e região”.[4]

Outra vez surge a pergunta: Qual é a medida desta intervenção desde o ponto de vista islâmico? talvez a intervenção do estado – Islâmico – nas atividades econômicas está marcada pela globalidade e o abarcamento, de uma forma que lhe confere o domínio sobre o movimento da economia na sociedade, e a posse do poder central para dirigir esta economia mediante uma resolução central firme, um severo controle, e uma globalidade que não permite a concorrência? ou talvez se contenta com controlar, orientar e supervisionar?

Isso é o que veremos mediante uma leitura rápida do pensamento do imam mártir Muhammad Baqir As-Sadr em sua elaboração do princípio ou teoria da intervenção do estado na atividade econômica de acordo à escola econômica islâmica, para o qual dedicou uma seção no último capítulo de seu livro “Iqtisaduna” sob o título “a responsabilidade do estado na economia islâmica”.

Em resposta a essa pergunta o mártir As-Sadr diz o seguinte: “É possível delimitar as responsabilidades do estado islâmico com respeito à vida econômica na sociedade em duas grandes linhas: uma delas é a aplicação dos elementos estáveis da economia islâmica, e a outra é rechear os elementos variáveis de acordo às circunstancias da realidade atual e à luz das orientações islâmicas gerais”.[5]

Vemos assim que há elementos e orientações estáveis na economia islâmica, que são os que estipularam a shari‘ah ou lei islâmica permitindo-os ou proibindo os mesmos, e que não está permitido contrariá-los em nenhum caso, como assim também não legislar o que os contradiga. Também há elementos variáveis, querendo significar com os mesmos aquelas normas nas que se observou à mudança das circunstâncias e o progresso da vida, e que não devem contradizer as orientações gerais e os elementos estáveis da shari‘ah.

Frente a esses dois elementos (o estável e o variável) faz-se patente à responsabilidade do estado islâmico, já que “a intervenção do estado não se restringe à mera aplicação das normas estáveis, senão que se estende a rechear a “zona de esvaziamento” da legislação, e (o estado) por um lado vigia a aplicação dos elementos estáveis da legislação, e por outro lado dispõe os elementos variáveis de acordo às circunstancias”.[6]

Através disto se faz manifesto que as responsabilidades do estado não se restringem à supervisão, vigilância, orientação e administração, senão que se estendem à área da legislação, já que “o estado preenche essa “zona de esvaziamento” que a legislação islâmica lhe deixou ao estado, de forma que o faça à luz das circunstâncias variáveis de uma forma que garanta os objetivos gerais da economia islâmica, e concretize o esquema islâmico da justiça social”.[7]

O preenchido desta zona de esvaziamento é delegado ao governante islâmico, sendo assim tanto na época do Profeta (S.A.W) ou bem em épocas posteriores. É por isso que aquilo que o Profeta (S.A.W) realizou a título de cobrir a zona de esvaziamento mediante estipulações legais, não representa questões estáveis e elementos não viáveis à mudança, já que são estipulações legais para cuja emissão foram observadas as circunstâncias que viviam a comunidade islâmica em sua época (S.A.W), já que “o grande Profeta (S.A.W) preencheu esse vazio mediante aquilo que seus nobres objetivos requeriam no âmbito econômico à luz das circunstâncias que viviam a sociedade islâmica, só que o Profeta (S.A.W) quando realizou essa ação, não o fez em sua condição de profeta anunciador da estável lei divina para toda época e lugar, de forma que tal ação em particular de preencher esse vazio, fora a expressão de uma forma legislativa estável, senão que o fez em sua qualidade de Wali Al-Amr a quem a shari‘ah fez responsável de cobrir a “zona de esvaziamento” de acordo com às circunstâncias”.[8]

É por isto que o mártir As-Sadr refuta aos juristas (fuqaha) que sustentam que a sentença do Profeta (S.A.W) consistente em não “se restrinja a água às palmeiras, nem se restrinja ao gado seu consumo”, conforme uma disposição que implica o significado de “desaconselhado” e não o de “proibição”. O que os levou a essa interpretação foi sua crença e fé em que o hadiz não podia indicar mais do que um desses dois significados: o de disposição “proibitiva” ou o de disposição que indica o “desaconselhável” do ato. Em base ao primeiro, a proibição do Profeta (S.A.W) com respeito a restringir “a água” será qualificada de ato “proibido na shari‘ah” bem como o é a proibição dos embriagantes ou outro similar. Em base ao segundo só será algo “desaconselhável” e nada mais.

Desde que o primeiro sentido resulta estranho para a mentalidade jurídica, viram-se obrigados a considerar o segundo sentido[9]. O que os obrigou a esta forma de interpretar foi o fato de não considerar uma terceira possibilidade, que é que o Profeta (S.A.W) tenha emitido algumas normas que gozavam da mesma estabilidade da qual contam as normas da shari‘ah, e o tenha feito em sua condição de Wali Al-Amr Al-Muslimin (encarregado ou regente dos assuntos dos muçulmanos) e não em sua condição de profeta e difusor da Mensagem. Esta realidade é que “o Profeta (S.A.W) e os Imames têm duas personalidades: a primeira em sua condição de difusores dos elementos estáveis que dispôs Deus, Elevado Seja; e a outra em sua condição de governantes ou líderes da sociedade islâmica que elaboram os elementos variáveis que lhes são inspirados pelas indicações gerais do Islã e o espírito social e humano da sagrada shari‘ah”.[10] Por exemplo o Mensageiro (S.A.W) proibiu temporariamente a realização de assuntos cuja licitude é categórica, como a proibição de alugar as terras, e Imam ‘Ali (A.S.) dispôs zakat (encargo religioso) sobre coisas fora daquelas às que lhes foi disposta o zakat na forma legislativa estável”.[11]

[1] Minhayuna fil Fikr-il qaum-il Ishtiraki, p. 526, Ed. Manshûrat Maktabat Az-Zaqafah wal I‘dad Al-Hisbi, Año 1979.
[2] Al-Atrash, Muhammad; Al-Perestroika wal-Ishtirakiiah war-Ra’sumaliah, p.7; Al-Mustaqbal Al-‘Arabi, p. 129, ed. Markaz Dirasat Al-Wahdah Al-‘Arabiiah, año 1989.
[3] Iqtisaduna, p. 680.
[4] Ibídem, p. 642.
[5] As-Sadr, Muhammad Baqir, Al-Islam Iaqûd-ul-Haiat, p. 119, ed. Wizarat Al-Irshad Al-Islami, Irán.
[6] Iqtisaduna, p. 680.
[7] Iqtisaduna, p. 680.
[8] Ibídem, p. 378.
[9] Ibídem, p. 286.
[10] Al-Islam Iaqûd-ul Haiat, p. 47.
[11] Ibídem, p. 50.

Por que uma zona de esvaziamento?

Existem dois tipos de relações na vida econômica: uma delas é a relação do ser humano com seu irmão ser humano, e a segunda é sua relação com a natureza ou as riquezas naturais. Estes dois tipos de relações se diferenciam no fato de que na segunda não é condição que o ser humano viva dentro de uma sociedade, já que em qualquer caso se encontra em conflito e fricção com a natureza e em interação com a mesma, sem que esta relação sua dependa do fato de que esteja dentro de uma sociedade, conquanto o que se encontre dentro da mesma implica a uma conjunção das experiências e a erudição, e isso é algo que incrementa o progresso dessa relação e acelera seu desenvolvimento.

Quanto à primeira relação, ou seja a do ser humano com seu irmão o ser humano, este existe dentro de um marco grupal, o qual é condição necessária para sua verificação e existência. É a partir desta relação que se originam os direitos e obrigações na sociedade.

Frente a esta grande diferença que existe entre estes dois tipos de relações, o Islã dispôs uma postura singular que realmente harmoniza com a natureza e que sem lugar a dúvidas é corroborada pela prática do ser humano e seu trato habitual com a mesma, no que respeita a subjugá-la para seu serviço e a aproveitar suas leis, suas riquezas e seus tesouros. Isto é assim enquanto o outro tipo de relação não viu um progresso como este, já que esta relação, por sua natureza, soluciona problemas estáveis e essenciais seja como for que varie o marco dessa relação, e como for que seu aspecto mude e se diferencie, como por exemplo sucede com o problema da distribuição da riqueza e o das remunerações, já seja que a produção se de ao nível do vapor e a eletricidade, ou ao nível do moinho de mão.

Então será muito real descrever as formas jurídicas e os aspectos canônicos que regulam a relação do ser humano com seu irmão o ser humano de uma forma estável e permanente – ainda que seja desde o aspecto teórico – Também será natural descrever as formas jurídicas reguladoras da relação com a natureza como sujeitas à mudança, ao desenvolvimento e à flexibilidade. Em base ao anterior, observa-se claramente a realidade dessa zona “de esvaziamento”, a qual se delegou encher ao governante islâmico (o hakim shar‘i) em base às indicações gerais da lei islâmica e seus elementos estáveis, em concordância às mudanças contínuas no âmbito da relação do ser humano com a natureza e as riquezas naturais; e isso é porque “o Islã não apresenta seus princípios legislativos para a vida econômica a título de remédio “provisório”, ou “ajuste por etapas”, na que depois de um período de tempo a história passa a outra forma de ajuste, senão que os apresenta em seu caráter de sistema teórico conveniente para todas as épocas. É por isso que para brindar ao sistema essa generalidade e abarcamento, necessariamente deve refletir as transformações das épocas no mesmo, por meio de um elemento variável que outorgue ao sistema o poder para a adaptação em concordância às diferentes circunstancias”.[1]

Ao mesmo tempo em que o princípio da zona “de esvaziamento” enfatiza o poder do Islã para brindar resposta às necessidades da humanidade e solucionar seus problemas, assim mesmo se descarta firmemente a suposição de que a existência da zona “de esvaziamento” indique uma carência na legislação ou seu descuido sobre certas questões e acontecimentos, e isso é porque “a shari’ah não dispôs “a zona de esvaziamento” de forma que isso signifique um defeito ou descuido, senão que delimitou suas leis para essa zona ao dotar a cada fenômeno com uma atribuição legislativa original, e brindando ao Wali Al-Amr (o tutor dos assuntos dos muçulmanos) a idoneidade para outorgar-lhes uma atribuição legislativa secundária, de acordo às circunstancias”.[2]

Então, a zona de esvaziamento formará uma parte constituinte na escola econômica islâmica, e de aqui resulta que “a formação da escola econômica no Islã não pode dar-se sem inserir no tema a “zona de esvaziamento”, avaliar as possibilidades dessa zona, e os alcances daquilo mediante o qual é possível valer-se para “enchê-la” valendo-se da zona contemplada originalmente pela shari‘ah mesma, para assim concretizar os objetivos da economia islâmica. Mas se descuidamos a zona de esvaziamento e o transcendental papel que desempenha, isso implicará fracionar as possibilidades da economia islâmica, considerar os elementos inamovíveis da mesma e deixar de lado os elementos variáveis”.[3]

Desta maneira, resumimos o dito da seguinte maneira: a intervenção do estado na área econômica se considera um dos três elementos que cooperam entre si e participam na materialização dos objetivos do regime islâmico no Islã.

Este regime se representa na disposição interna do muçulmano, a qual surge da crença islâmica, suas formas legislativas e reguladoras da atividade econômica, e a intervenção do estado em dita atividade[4]; na concretização dos objetivos da escola econômica islâmica no que se refere ao equilíbrio social; a segurança social; a observância do bem público e seu usufruto; a supervisão sobre a maior parte do movimento de produção e brindar as orientações necessárias para solucionar os problemas de caos na produção; dispor a política econômica para incrementar o rendimento (monetário) geral da sociedade dentro de formas jurídicas cuja concorrência é brindada pelo governante islâmico; resguardar os preços reais de intercambio das mercadorias e as diferentes formas de trabalho; combater o monopólio em todas as áreas da vida econômica, etc.[5]

[1] Iqtisaduna, p.681.
[2] Iqtisaduna, p.684.
[3] Iqtisaduna, pp.378 y 379.
[4] Ver: Al-Mubarak, Muhammad; Nizham Al-Islam: Al-Iqtisad, mabadi’ wa qawa‘id ‘ammah (O sistema do Islã: A economia; princípios e leis gerais), pp.103 y 104, Ed. Organização de Difusão Islâmica, Teherán, 1980.
[5] Al-Islam Iaqûd Al-Haiat, p.119.